quarta-feira, 18 de abril de 2007

Histórias Mínimas


História Mínimas é comédia, drama, poesia, amor, absurdo, morte, em palavras do próprio autor. Histórias Mínimas é esse “elo” freudiano que nos envergonha manifestar em público pelo que dirão e que quase sempre reprimimos.As Boas Raparigas… iniciaram a sua carreira com este espectáculo e têm regressado a ele com alguma frequência. em 2006, a companhia fez uma nova selecção onde apresenta histórias com miúdos que partem a lua, barbeiros que degolam os seus clientes, estrelas que se apagam com um sopro, brevíssimas pinceladas escritas com transbordante humor e inteligência, em que o quotidiano se torna absurdo e o absurdo se transforma no quotidiano.

PROJECTO ARTÍSTICO

Dentro de um percurso- ou antes durante, as tais coisas se vão fazendo, criando uma tendência à aceitação de formas novas (ou velhas) geralmente condicionadas à manutenção de zonas críticas de tensão, de diferença e, o que é mais importante, para a pesquisa de consciência de uma prática teatral que se reconhece a si mesma- pelo e pela forma de praticá-la. Todo o trabalho realizado mostra-se esboçado pelo grupo inserido num seu tempo e personificando as debilidades das circunstâncias. Seria sensato, pôr à prova, todo o trabalho elaborado por nós, como um projecto estético e de cultura.
A sinalização de todo um processo de realização teatral, à escala do grupo, só se afirma pelo que fomos elaborando em termos de espectáculos e de conquista-aceitação da parte de um público- de uma abertura para projectos de trabalhos futuros delineados pelo próprio processo e sentindo os sinais de uma identidade própria.
Numa primeira abordagem, o nosso objectivo é desregular os sentidos visando uma sensação mais intensa. Somos a favor do inconsciente e do corporal. Defendemos a palavra e o texto e privilegiamos o elemento estético-sensual e a criatividade na vertente do actor como factor de unidade fundamental. O efeito sobre o inconsciente fomenta a descodificação; pela palavra possuímos a maximização do fluxo da libido. Não se trata de meras formulações de Princípios. Convencemo-nos disso ao longo dos trabalhos apresentados ultimamente. Praticámos a intertextualidade pela via dos fragmentos e das situações. A forma como a representação se dirige ao público pode ser mais directa e direccionada ou mais enigmática, exigindo nesse caso, a participação activa do receptor na construção de significações. Mais importante que a percepção cognitiva é a co-produção do espectador. De um lado uma tendência progressiva do diálogo ao monólogo (basta comparar as peças "Histórias Mínimas" com "Quatro Horas em Chatila") , podendo levar a um fluxo pulsional e, de outro, uma tendência à despsicologização e ao distanciamento crítico, chegando à desconstrucção.
Para nós o texto não deve ser transposto para o palco como informação, mas como melodia que se move livre no espaço. Destacámos a diferença entre o teatral e o dramático. Como em Kafka: uma opção pela abertura via metáfora, mas sem processo polissémico.
Político, independente de ideologias, o que importa é questionar a realidade, conceder ao público vivências que mobilizam a sua capacidade de sentir, perceber, criar, reagir, transformando o teatro num laboratório de fantasia social.
A construção da narrativa do espectáculo organiza-se a partir dos materiais significantes, não havendo muita preocupação em partir de um sentido geral que totalize o conjunto. Mesmo existindo um esboço de enredo fazemos questão de agregar ao fio narrativo várias fontes paralelas de enunciação. São fios enredados na luz, no espaço e em situações visuais, musicais ou verbais que nada têm a ver, a princípio, com o assunto. Por vezes, utilizámos referências de espectáculos anteriores, criando assim possibilidades de interferências de Mundos e Tempos diferentes. Por vezes, a desconstrucção é outro procedimento que interfere nos espectáculos (ex: "O Paraíso" de Alberto Moravia") outras vezes são blocos de matéria verbal distribuídos entre actores e não definindo uma comunicação interurbana verbal (recordar "Chatila" de Jean Genet. ) O foco organizador de referências é sempre a memória de grupo como se tem revelado no processo de trabalho e na realização dos espectáculos. Outra preocupação: o que vem antes não determina o que vem depois; a mesma situação pode reaparecer de forma quase idêntica ou sofrer um processo de transformações, que nem por isso desenham uma narrativa sequencial.
Distanciados do que acima dissemos, como análise e balanço da nossa experiência, acrescentamos ainda que o fim e o valor do teatro estará na abordagem da obtenção de uma resposta (nunca haverá resposta) para a questão do Homem. Pensamos que cada cultura tem os seus próprios mitos. Cada época, por seu turno tem muitas particularidades. E, eis o caos, com o seu Efeito"Borboleta" , os buracos negros e o Big-Bang, fazendo uma entrada na cena mítica.Mas o mito só desaparece para renascer melhorado, e sob aspectos incessantemente renovados, contar eternamente a mesma história -do homem e da natureza, do anjo e do demónio, de Deus e do Diabo. Os mitos, e em particular os mitos científicos, são maniqueístas. Todo o Big-Bang pressupõe um buraco negro e toda a fórmula mágica uma bomba atómica. Entre dois extremos, abre-se a falha da dúvida e da incerteza. Revolta por não compreendermos, por nos sentirmos excluídos, por não pudermos ter acesso. E este pequeno desespero, bem vulgar, traduzir-se-ia por nada menos do que um furto, de uma imagem ou de uma palavra, de uma maçã ou de um todo relativo- depressa capturados e desviados do sentido inicial. Esta conduta culpabilizante faz apelo a outra, mais atenta ao nascimento e à edificação dos mitos (hoje os mitos científicos). O regresso às origens começa, como é evidente, por um regresso aos textos fundadores. Daí, a perspectiva para um programa de trabalho futuro:
a)- entre o incompreensível e o quotidiano;
b)-Deve ser imperativamente duplo, esquizofrénico, capaz tanto do melhor como do pior;
c)- Aproximação à tragédia como leitura do Homem no social contemporâneo.